Capítulo 8 – Santiago de Compostela: Entre Lendas, Fé e um Brasileiro no Caminho

Chegamos a Santiago de Compostela no final da tarde, guiados por uma luz dourada que banhava as ruelas de pedra e os telhados de ardósia com uma aura quase divina. O céu parecia saber que ali, naquela cidade, tudo é sagrado — até o silêncio.

Foi ao pisarmos na Praça do Obradoiro que sentimos. Aquele peso suave de quem chega ao fim de um ciclo, mesmo sem ter feito a caminhada tradicional. Estávamos diante da Catedral de Santiago de Compostela, onde, segundo a tradição, repousam os restos mortais do apóstolo Tiago Maior, patrono da Espanha, e símbolo maior do caminho que leva o seu nome.

A cidade que acolhe peregrinos e viajantes de coração aberto

O clima era sereno e, ao mesmo tempo, carregado de emoção. Peregrinos ajoelhados, outros chorando discretamente, muitos com o cajado e a concha pendurada ao pescoço — símbolo da jornada completada. Nós não havíamos feito o Caminho a pé, mas sentíamos como se nossos corações tivessem sido guiados até ali por algo muito maior do que a vontade de conhecer mais um destino.

À noite, com a cidade ainda viva e iluminada por faróis suaves, conhecemos Fernando, um brasileiro acolhedor e de riso fácil, dono do restaurante O Fumador. Sua comida era boa — mas suas histórias, ainda melhores.

A lenda do peregrino enforcado e o milagre de São Tiago

Com um copo de vinho galego nas mãos e a voz cheia de sotaque português misturado com o espanhol local, Fernando nos contou a lenda do “Peregrino Enforcado”. Um jovem e seu pai, vindos de longe, pararam em um albergue no caminho. Lá, o rapaz foi falsamente acusado de roubo e, injustamente, condenado à forca.

Dias depois, ao passarem novamente pelo local, os pais encontraram o corpo do filho ainda vivo, sustentado por São Tiago. O santo teria impedido a morte, mantendo-o salvo até que a injustiça fosse desfeita.

Essa lenda está eternizada em uma escultura dentro da catedral, e é contada a todos que passam por ali, lembrando que o Caminho de Santiago não é apenas físico — é espiritual, é redentor, é milagroso.

A Porta Santa e os Anos Santos Compostelanos

Fernando então nos guiou, mesmo que apenas com palavras, até a famosa Porta Santa da Catedral — a Porta da Esperança. Ela só se abre durante os Anos Santos Jacobeus, que ocorrem quando o dia 25 de julho, dia de São Tiago, cai em um domingo. Isso se dá em ciclos de 6, 5, 6 e 11 anos, sendo o último celebrado em 2021 e o próximo em 2027.

A tradição diz que, ao atravessar essa porta durante o Ano Santo, após confissão e comunhão, o peregrino pode receber indulgência plenária, uma espécie de renovação espiritual completa.

Ali, diante da porta ainda fechada, sentimos que ela também se abria dentro de nós.

A Praça do Cavalinho e os detalhes escondidos

“Não deixem de ir até a Praça do Cavalinho”, disse Fernando, com um sorriso. Fomos, é claro. Ali, num canto mais discreto da cidade, descobrimos uma pequena praça onde há uma estátua de bronze de um cavalo — um ponto de referência cheio de mistério. Alguns dizem que representa o próprio apóstolo Tiago em uma de suas aparições milagrosas, outros dizem que é apenas uma homenagem aos animais que tanto acompanharam os caminhantes.

Seja como for, a praça é silenciosa, com um charme antigo, e parece guardar mais histórias do que revela.

O sabor da Galícia: jamón e vinho

Antes de nos despedirmos de Fernando, ele nos trouxe um prato simples, mas inesquecível: jamón ibérico, cortado finíssimo, acompanhado de pão galego e azeite. Explicou com entusiasmo as diferenças entre o jamón serrano e o jamón ibérico, o processo de cura, o tempo, o sal, o porco — tudo feito com uma paixão que apenas quem ama suas raízes pode expressar.

Bia, enquanto mastigava devagar, disse: “A gente veio atrás de lendas… e encontramos sabores com alma.”

Um encontro que foi mais do que acaso

Naquela noite, antes de voltarmos ao hotel, sentamos na escadaria da Catedral. A praça estava quase vazia. O frio começava a subir pelas pernas, mas o coração estava quente. Santiago de Compostela tinha nos presenteado com mais do que belas paisagens: nos ofereceu lendas, fé, encontros e acolhimento.

E como tudo que é sagrado, não estava no plano — estava no destino.

Conclusão: Santiago é mais que chegada, é revelação

Santiago de Compostela é um fim de caminho — mas é também um recomeço. Mesmo para quem não percorreu quilômetros a pé, a cidade transforma. Entre pedras milenares e portas que se abrem apenas de tempos em tempos, descobrimos que há lugares onde o passado, o presente e o divino se tocam. E nesse toque, sentimos que estávamos exatamente onde deveríamos estar.

Obrigado, Santiago.

Obrigado, Fernando.

E obrigado, Caminho, por nos encontrar — mesmo sem termos pedido.

#santiagodecompostela #caminhodesantiago #portasanta #anossantojacobeu #lendasdecaminhos #jamoniberico #aventurasaovento #lucianaeclaudio #biaemgalicia #restosmortaisapostolotiago

Leave a Reply

Proceed Booking